Por Arthur Soffiati
O território da ecorregião de São Thomé (entre os rios Itapemirim e Macaé) já está saturado de empreendimentos grandes e impactantes pelo prisma ambiental e social. Apontemos apenas alguns. Em Macaé, a instalação de uma base da Petrobras para operações de exploração de petróleo e gás na plataforma continental promoveu o crescimento desordenado da cidade, atraiu pessoas de todo o Brasil em busca de emprego (nem sempre encontrado), destruiu o manguezal do estuário do rio Macaé, promoveu grande conurbação dos núcleos urbanos de Macaé, Rio das Ostras, Barra de São João e Unamar, aumentou a pobreza e a criminalidade, entre outros. Agora, anuncia-se a instalação de novo porto e de unidades termelétricas de energia resfriadas pelo rio Macaé, que já teve ultrapassada em muito sua capacidade de oferta de água.
Projetou-se um porto megalomaníaco para Carapebus, até agora, felizmente, não levado adiante. Barra do Furado, que se situa na foz de um rio construído (canal da Flecha), teve empreendimentos pesados projetados para o local, do qual dois foram adiante e hoje se encontram carentes de manutenção: os espigões mar adentro em ambas as margens do canal avançando mar adentro e um terminal pesqueiro não concluído. Outros dois foram abandonados. Mas o espectro de um novo continua pairando sobre o local. No Açu, instalou-se um distrito industrial-portuário que causou impactos à restinga e a seus habitantes, que viviam de uma economia extrativista-ruralista de baixo impacto. Hoje, o grande empreendimento enfrenta erosão marinha, salinização e umidade excessivas, mas tem projetos de expansão.
Projeta-se para São Francisco de Itabapoana uma unidade portuária associada a termelétricas refrigeradas com água do rio Itabapoana. E junto à foz deste, em sua margem esquerda, já no Espírito Santo, a instalação do Porto Central ameaça a normalidade do ambiente e dos moradores. Nem sempre, os anúncios desses empreendimentos indicam a verdadeira intenção de instalação. Pode-se suspeitar que sejam mais especulações que intenções reais de instalação. Seja como for, criam-se expectativas de impactos e de postos de trabalho junto à população local. Criam-se ilusões.
A empresa Alupar Investimentos S.A. anuncia a intenção de instalar uma termelétrica em Barra do Furado, entre os municípios de Quissamã e Campos dos Goytacazes, numa área que abrange o canal da Flecha e a localidade de Barra do Furado, mas com impactos ambientais diretos e indiretos num âmbito bem mais abrangente. Os signatários da proposta de compensação socioambiental para a instalação e operação da termelétrica Barra do Furado recapitulam os cinco empreendimentos anteriores para o mesmo local.
Espera-se, agora, em primeiro lugar, que o projeto de instalação e operação de uma termelétrica não vá adiante. Se for, que promova compensações de ordem social e ambiental, pois vive-se um momento de reconhecimento de impactos socioambientais causados por políticas públicas e iniciativas empresariais. Por mais que se argumente ser responsabilidade de toda a sociedade, tais impactos, causados por um paradigma que considera a natureza uma entidade infinita capaz de fornecer recursos e de absorver desejos, contraria o que a ciência vem demonstrando: cada vez de forma mais incisiva, o desenvolvimento deve reconhecer limites, identificá-los e respeitá-los.
Os ambientes naturais mais significativos em Barra do Furado são os ecossistemas aquáticos e o manguezal, dos quais dependem a mariscagem e a pesca. A proteção do manguezal de Barra do Furado deve contemplar os bosques de mangue da margem direita e esquerda do canal: o da ilha da Carapeba (o mais extenso e mais completo), o da margem direita do canal da Flecha e o de São Miguel.
Manguezal
Explica a paleontologia que o reino vegetal teve sua origem no mar a partir de algas. Aos poucos, as plantas foram conquistando o meio terrestre e se adaptando a ele. Uma mudança fundamental foi o desenvolvimento de vasos condutores de seiva. Poucos vegetais não contam com vasos para transportar seiva, como é o caso dos musgos.
O grupo vegetal mais desenvolvido é representado pelas angiospermas, chamadas plantas completas, pois contam com raízes, caule, folhas, flores, frutos e sementes. Em torno de 60 milhões de anos, no atual Sudeste Asiático, plantas angiospermas fizeram uma experiência: voltar a viver em ambiente mais salino e mais úmido que os encontrados em meio terrestre. Ao molhar novamente os pés na praia e fixá-los num ambiente que haviam abandonado, o reino vegetal criou as diversas espécies denominadas de mangue. O retorno ao mar, agora na condição de angiosperma, encontrava sérios problemas de adaptação. Os mais complexos eram 1) lidar com o excesso de água, 2) lidar com o excesso de sal e 3) carência de ar no solo. As espécies de mangue encontraram solução para tais problemas, mas não conseguiram se adaptar a climas temperados e frios. Assim, elas se limitaram ao ambiente costeiro entre os Trópicos de Câncer e de Capricórnio, pouco acima de um e pouco abaixo de outro.
Em resumo, só existem manguezais na zona costeira e intertropical. Para diluir a salinidade, as espécies de mangue se instalaram, preferencialmente, na foz de rios junto ao mar, pois as águas fluviais diluem o sal, criando água salobra. Este ambiente, nem doce nem muito salino, é chamado de estuário. O manguezal, contudo, pode também se desenvolver em lagoas costeiras e em praias onde a salinidade e a força do mar são baixas.
Para lidar com o excesso de sal, as espécies de mangue criaram três mecanismos: barrar a entrada dele no organismo da planta, diluí-lo no interior da planta e expelir o excedente por glândulas existentes nas folhas. O solo, suporte terrestre para as árvores de mangue, normalmente é formado por partículas muito finas. Com a água, ele se torna muito compactado e pobre de ar. Além do mais, a decomposição de matéria orgânica produz gás metano.
Para respirar, as plantas de mangue, ao lado das raízes alimentadoras, que existem em todas as angiospermas, desenvolveram também raízes respiratórias, que, em vez de se dirigirem para o fundo da terra, vêm à tona, em busca do ar. Essas raízes chamam-se pneumatóforos. Na ponta delas, existem pequenos poros, denominados lenticelas, que absorvem o ar quando a maré baixa e se fecham quando ela sobe. No caso do mangue vermelho, o caule se ramifica a partir do caule central. As lenticelas se desenvolvem nesse caule ramificado. As raízes respiratórias podem ser comparadas ao tubo de um mergulhador: a haste é o pneumatóforo e o furo por onde entra o ar é a lenticela.
Quanto à reprodução, as plantas exclusivas de manguezal se propagam por meio de frutos que ficam presas na árvore-mãe até estarem prontas para a germinação, tão logo caiam no chão. Os cientistas as denominam de propágulos. Se caem na água, elas apresentam a faculdade de permanecer muito tempo com capacidade germinativa. Os propágulos são resistentes para navegar por muito tempo. Foi assim que os manguezais conquistaram o mundo intertropical a partir do Sudeste Asiático, seu lugar de origem.
O manguezal se constitui em ambiente altamente rico. As folhas, antes mesmo de caírem no chão, já estão sofrendo o ataque de fungos. Bactérias, fungos e caranguejos, entre outros organismos, incumbem-se de triturar as folhas para que elas se tornem alimento de animais residentes no manguezal e para que, transportadas pelas marés, alimentem animais do mar.
Em época de reprodução, várias espécies animais dos rios e do mar entram nos canais dos manguezais e ali acasalam e procriam. O manguezal, além de fabricar alimento, oferece abrigo para a reprodução e para o crescimento dos filhotes. Ele também protege a costa da erosão. Nas costas colonizadas por manguezais existe mais peixe, e a pesca é mais farta que em lugares sem manguezal.
Embora existam cerca de 50 espécies exclusivas de manguezal em toda zona intertropical, na costa atlântica da América, apenas seis são encontradas. Dessas seis, só quatro existem no Sudeste e sul do Brasil: mangue branco (Laguncularia racemosa), mangue vermelho (Rhizophora mangle) e mangue preto (Avicennia schaueriana e Avicennia germinans).
Manguezais entre Guaxindiba e Barra do Furado
Entre os rios Guaxindiba e o Iguaçu, formou-se uma grande restinga nos últimos 2.500 anos antes do presente (AP). A ação conjugada do rio Paraíba do Sul, incidindo perpendicularmente sobre o mar, e as correntes marinhas, correndo paralelamente, foram as forças responsáveis pela construção dessa restinga. As desembocaduras de rios no mar criaram estuários favoráveis à constituição de manguezais. No rio Guaxindiba, o manguezal se ampliou pela abertura do canal Engenheiro Antonio Resende, obra do DNOS. Ele corresponde ao canal da Flecha na margem esquerda do rio Paraíba do Sul.
O maior manguezal desta restinga localiza-se na foz do rio Paraíba do Sul, que outrora acionava um grande delta formado pelo canal de Gargaú e Atafona e pelas lagoas de Grussaí e Iquipari. Nas duas últimas, só abertos em grandes cheias no passado, também havia manguezais. Na lagoa de Grussaí, é grande a poluição urbana. A lagoa de Iquipari conta hoje, na sua margem esquerda, com a Reserva Particular do Patrimônio Natural da Caruara. Na lagoa, só se encontram os mangues branco e vermelho. Mais abaixo, desembocava o rio Iguaçu, com nascente na lagoa Feia e curso entre o cômoro da praia do Farol de São Tomé e a planície aluvial. Este rio perdeu vazão com a abertura da vala do Furado e depois com o canal da Flecha, transformando-se na lagoa do Açu. Mas o manguezal que se constituiu nele ainda é pujante e conta com três espécies do Sudeste e com o mangue-de-botão, não considerado por todos os especialistas como uma espécie de mangue.
Daí em diante, a restinga se reduz a um estreito e alto cordão de 28 quilômetros que liga a restinga de Paraíba do Sul à restinga de Jurubatiba. A partir da lagoa do Açu, só será encontrado manguezal no canal da Flecha e no rio Iguaçu (do Espinho). Ele deve ter se formado pela abertura de Barra do Furado ou pelo canal da Flecha. A possibilidade de que tenham subido o rio Iguaçu a partir de sua foz parece remota.
Na restinga de Jurubatiba não existem pontos costeiros com manguezais. Eles só voltarão a ser encontrados na foz do rio Macaé.
O manguezal do canal da Flecha
Antes das grandes obras de canalização e drenagem promovidas pelos diversos órgãos de saneamento da Baixada Fluminense e pelo Departamento Nacional de Obras e Saneamento, as intervenções antrópicas de grande porte na região foram a vala do Furado, o canal da Onça, o canal Campos-Macaé, o canal do Nogueira e o canal de Cacimbas (SOFFIATI, Arthur. Os canais de navegação do século XIX no Norte Fluminense. Boletim do Observatório Ambiental Alberto Ribeiro Lamego nº 2 (Edição Especial). Campos dos Goytacazes: CEFET Campos, jul/dez 2007). Em 1837, Henrique Luiz de Niemeyer Bellegarde apontava cinco defluentes da lagoa Feia, além do canal do Furado: os rios da Onça, Novo do Colégio (talvez aberto pelos jesuítas baseados na fazenda do Colégio), da Castanheta, do Barro Vermelho e do Iguaçu. Os cinco, ainda segundo o mesmo autor, uniam-se no rio Iguaçu, que fluía por trás do cômoro da praia de São Tomé até defluir no mar pela chamada Barra do Canzoza ou do Açu (BELLEGARDE, Henrique Luiz de Niemeyer. Relatório da 4ª Seção de Obras Públicas da Província do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Imprensa Americana de I. P. da Costa, 1837).
Mesmo depois de aberta a vala do Furado em 1688, pelo capitão José de Barcelos Machado, com a intenção de abreviar o escoamento de águas de cheia, o rio Iguaçu continuou a funcionar como principal distributário da lagoa Feia para o mar. Isso porque a energia oceânica em Barra do Furado é muito forte e a tamponava de areia rapidamente a vala depois de aberta.
Num mapa organizado em 1846, aparecem os rios da Onça, do Furado e Barro Vermelho (L’ILE ADAM. Visconde J. de Villiers de. Carta Topográfica e Administrativa da Província do Rio de Janeiro e do Município Neutro erigida segundo os melhores mapas publicados até agora: apresentando pela primeira vez os novos municípios S. João, Capivari, Bonito, Saquarema, e Estrela, as freguesias que foram criadas pela Assembleia Legislativa até setembro de 1846 e o canal quase acabado de Campos a Macaé. Rio de Janeiro: Litografia Imperial de Vr. Larée, cerca de 1846). Em outro mapa bem mais detalhado, de 1865, figuram os rios da Onça, Novo do Colégio, da Castanheta, do Furado e do Iguaçu, faltando apenas o Barro Vermelho (BELLEGARDE, Pedro D’Alcantara; NIEMEYER, Conrado Jacob de. Nova Carta Corográfica da Província do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: publicada por Eduardo Bensburg/Litografia Imperial, 1865). Esses rios acabavam formando ilhas imensas em suas interseções. Ainda em fevereiro de 1968, um mapa elaborado pela Engenharia Gallioli Ltda para o DNOS registra a ilha da Carapeba no complexo lagunar que se formava na foz do canal da Flecha (DNOS. Baixada Campista: saneamento das Várzeas nas margens do Rio Paraíba do Sul à Jusante de São Fidélis: estudos e planejamentos complementares. Planimetria geral, folha n.º 3. Rio de Janeiro: Engenharia Gallioli Ltda., fev/1968).
O complexo sistema hídrico do rio Iguaçu pode ter permitido a constituição de um manguezal de sua foz até seus formadores, pois a área é muito baixa e permitia o avanço das marés até pontos muito distantes da foz. A mais antiga referência conhecida feita a árvores de mangue consta no Roteiro dos Sete Capitães (SOFFIATI, Arthur (org.) “Os mais antigos documentos europeus sobre a Capitania de São Tomé”. Campos dos Goytacazes: Essentia, 2023). Diz o autor do texto que, na segunda viagem dos sete fidalgos às suas sesmarias, em 1633, no Norte Fluminense, a expedição deparou-se com árvores de quiribas, correspondentes talvez a siriba ou siribeira (Avicennia).
Assim, os manguezais da lagoa do Açu (parte do antigo rio Iguaçu), da ilha da Carapeba e do chamado rio do Espinho podem ser fragmentos de um antigo manguezal contínuo, cortado pelas obras de macrodrenagem efetuadas principalmente pela Comissão de Saneamento da Baixada Fluminense e pelo Departamento Nacional de Obras e Saneamento a partir de 1935. Também as estradas construídas nessa grande área úmida alteraram profundamente a fisionomia do complexo do rio Iguaçu.
Segundo o mais completo levantamento efetuado sobre o manguezal da Carapeba, a área do manguezal conta com bosque, lavado e apicum. A única espécie exclusiva de manguezal identificada é a Laguncularia racemosa. No apicum, desenvolvem-se principalmente a grama doce (Paspalum vaginatum), o capotiraguá (Sesuvium portulacastrum), a beldroega (Bultaparom portulacoides), o praturá (Salicornia gaudichaudiana) e a grama da praia (Sporobolus virginicus). Entre moluscos, foram registradas, no manguezal, as espécies buso-do-mangue (Litorina angulifera), cafezinho (Melampus coffeus), broca da madeira (Teredo sp.) e Neritina virginica. Sobre os mariscos, o estudo ressalta que unha-de-velho (Tagellus plebeius), tarioba (Iphigenia brasiliensis), ameija (Lucina pectinata), samanguaiá (Anomalocardia brasiliana) e ostra (Ostrea rhizophorae) foram identificadas somente por valvas vazias. Com relação aos crustáceos, estão presentes o chama-maré (Uca spp.), o uçá (Ucides cordatus), o aratu-vermelho-e-preto (Goniopsis cruentata), o marinheiro (Aratus pisonii), o preguiçoso (Panopeus herbsti), o aratu (Sesarma sp.) e o guaiamum (Cardisoma guanhumi).
O manguezal abriga um ninhal, essencial para as aves que residem no ecossistema, bem como área dormitório para outras aves que passam o dia fora do ambiente. Ressalta-se ainda que algumas espécies de maçaricos migratórios também residem no manguezal para se alimentarem na temporada de inverno dos países da América do Norte, lembrando que o Brasil é signatário de convenções internacionais que protegem essas aves e que deveria proteger os ambientes visitados aqui no país.
O estudo observa que só existe um canal de comunicação entre o manguezal e o canal da Flecha. Se ele for bloqueado por ação natural ou antrópica, o que já foi registrado, o manguezal pode ficar privado das águas de marés ou com a rizosfera submersa. Nos dois casos, as plantas de mangue podem manifestar sinais de estresse, como se verificou com um episódio de alagamento do ecossistema, levando indivíduos de mangue branco a emitir raízes adventícias acima da superfície da água. Detectou-se ainda a salinidade elevada por conta da influência do mar, seja pelas ondas que ultrapassam a crista da praia, seja pela penetração da língua salina no lençol freático (Relatório final sobre as condições abióticas e bióticas do Manguezal de Carapeba. Grupo Mundo da Lama, Movimento de Articulação em Educação. Rio de Janeiro, 17 set. 2007).
Em vistoria efetuada em 20 de julho de 2025, verificou-se que o manguezal da Carapeba se diversificou no bosque. O mangue-vermelho (Rhizophora mangle) e a siribeira (Avicennia germinans) contam com vários exemplares, embora o mangue branco (Laguncularia racemosa) continue sendo dominante. Na margem direita do canal da Flecha, as três espécies também estão presentes. O apicum mostra muitas tocas de guaiamum e também gado.
Em termos de impactos ambientais, o manguezal já sofreu com a criação de gado em seu interior. Sofre ainda com o corte de árvores e a disposição de lixo no seu âmbito. Como fatores de agressão indireta, apontem-se a construção de uma estrada, que seccionou a área do manguezal, impedindo o fluxo de água tão necessário à sua existência, e os molhes de pedra, que estão contribuindo para erodir a praia atrás da qual localiza-se o manguezal. As ondas bravias da maré cheia já atravessam o cômoro e atingem o manguezal, transportando sedimentos arenosos que soterram as raízes respiratórias e as lenticelas das árvores, ameaçando-as de morte.
A despeito dos problemas apontados, notam-se sinais de vitalidade no manguezal. Diversas espécies de aves buscam nele alimentos. Se o manguezal da Carapeba, na margem esquerda do canal da Flecha, aparenta ser antigo, o da margem direita, na vila de Barra do Furado, é novo. Também formado no início exclusivamente por Laguncularia racemosa, foi possível acompanhar seu desenvolvimento desde a fase de propágulo à fase adulta. O canal transformou-se numa espécie de rio. Assim, a água doce proveniente da lagoa Feia, encontrando-se com a água salgada que entra pelo canal, forma a água salobra, uma das principais condições para o desenvolvimento e a manutenção de um manguezal. No caso desse pequeno manguezal, os propágulos podem ter vindo do mar e empurrados para o interior do canal ou podem ser provenientes do manguezal da Carapeba. Ele se diversificou e conta com as três espécies de mangue da região. O manguezal da Fazenda São Miguel é formado por mangue branco e siribeira.
Sequestro de carbono
Um dos fortes motivos para preservar áreas de manguezal, que incluem o bosque propriamente dito, o lavado (canais por onde sobem e descem as de marés que se encontram com água doce, formando estuários) e o apicum, área com grande concentração de sal onde as plantas de manguezal não se desenvolvem, mas podem se converter naturalmente a terras favoráveis a elas, é a capacidade do ecossistema como um todo de sequestrar carbono. Essa capacidade é maior que a das florestas tropicais. Assim, a ciência descobre mais uma função exercida pelo manguezal, ao lado da proteção da linha de costa, da atenuação dos ventos e das ressacas e da condição de berçário: o combate às mudanças climáticas. Ressalte-se sempre a importante função de geração de renda para comunidades tradicionais.
Proposta de preservação
Lê-se no Relatório de Impacto Ambiental do empreendimento (Alupar Investimentos SA) que “Os manguezais são um tipo de vegetação presentes no interior das baías e enseadas, preferencialmente na foz dos rios com o mar. Normalmente apresentam espécies vegetais bem características, com basicamente três espécies de mangues: Rhizophora mangle (mangue-branco), Avicennia schaueriana e Laguncularia racemosa (mangue-vermelho)”. Em poucas palavras, a empresa comete muitos erros, até mesmo de português. Rhizophora mangle é o nome científico do mangue vermelho, não do mangue branco, enquanto Laguncularia racemosa é o nome científico do mangue branco.
O novo Código Florestal define o manguezal como Área de Preservação Permanente (APP), excluindo o apicum. O Plano Diretor Participativo de Campos, instituído pela Lei nº. 7.972, de 31 de março de 2008, delibera que o manguezal da Carapeba deve ser protegido por uma Unidade de Conservação.
O que se propõe é a criação de uma área protegida por iniciativa do poder público municipal de Campos. Cabe avaliar a questão fundiária e promover a desapropriação legal devida ou a aquisição das terras entre as comportas do canal da Flecha e a praia, do lado de Campos dos Goytacazes. Seria criada, no manguezal da Carapeba, uma grande reserva compreendendo o bosque de mangue, o lavado e o apicum. Para fins educacionais e turísticos, uma grande passarela de madeira, construída nos moldes das que existem em vários lugares do mundo e no Brasil, atravessaria as três zonas do manguezal. Orientações escritas e visitas com guias poderiam ser promovidas pela empresa ou em conjunto com a prefeitura de Campos dos Goytacazes. Para atender a visitantes provenientes de Barra do Furado, a passarela poderia ser acessada logo após a ponte sobre o canal da Flecha, como mostra a figura abaixo.
Agora, pode-se falar do manguezal de Barra do Furado, nas margens direita e esquerda do canal da Flecha, juntamente com o pequeno bosque da capela São Miguel. Este último deveria ser protegido com uma carca para impedir a entrada de animais de criação. O de Barra do Furado já atende a pescadores e marisqueiras. O de São Miguel pode vir a atender à atividade extrativista.
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