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domingo, 15 de agosto de 2021

Buraco do Ministro


Por Arthur Soffiati


Não se pode entender por que existe um ponto em Barra do Furado conhecido como Buraco do Ministro sem conhecer a história geográfica do local. Podemos identificar três momentos para se saber o motivo daquele ponto se chamar Buraco do Ministro ainda hoje.


Primeiro momento: recue no tempo e volte à 1500, ano em que Cabral chegou ao Brasil. Não precisa tanto. 1600 está bom. Nesse distante ano, não existia Barra do Furado. Havia um rio que nascia na lagoa Feia, engordava no Lagamar e chegava ao mar em Barra do Açu. Esse rio recebia vários nomes. Seu primeiro trecho era conhecido como rio Barro Vermelho como ainda hoje. Depois, passou a se chamar Furado. Mais adiante, virava rio Viegas, entrava no Lagamar e saía com o nome de canal do Farol, conforme mostra a linha em azul no mapa abaixo. Mais adiante, ele formava o grande banhado da Boa Vista e saía dele com o nome de rio Açu até chegar ao mar. Juntando todos os nomes que esse rio tinha, o nome geral era rio Iguaçu. Era um rio importante do qual restaram fragmentos, sendo o mais íntegro a lagoa do Açu. Correndo em nível mais baixo que o do Paraíba do Sul, os transbordamentos deste desciam e engordava o rio Iguaçu. 

Segundo momento (1688-1949): Mas ele recebeu um golpe em 1688 do qual nunca se recuperou. No ponto em que passava mais perto do mar. O capitão José de Barcelos Machado, senhor do Morgado de Capivari e rico proprietário de terra abriu uma vala do rio Iguaçu até o mar para encurtar o escoamento de água doce advinda das chuvas de verão para o mar. A saída na Barra do Açu era distante. Quando havia muita água doce acumulada no continente, a vala do Furado era aberta para a água sair mais rapidamente para o mar e deixar as terras submersas livres para plantar e criar gado. Quando a água doce baixava de nível, o mar fechava a vala. Só no ano seguinte ela seria aberta. Enquanto permaneceram no Brasil, os Jesuítas mantinham a Barra do Furado aberta com o trabalho de seus escravos. Quando foram expulsos do Império Colonial Português, esse trabalho era feito de modo irregular. Havia também outro ponto que se abria nesse rio. Era a chamada Barra Velha. Consta que a força da água doce a abria sozinha, mas tudo indica que ela era rasgada com a força humana também. Pouco se sabe a respeito. Os pontos em vermelho mostram a Barra do Furado e a Barra Velha no mapa abaixo.  

Terceiro momento (1949 aos dias atuais): com a necessidade de mais terras para a cana e o gado, os órgãos oficiais de engenharia hidráulica concluíram que a Barra do Furado era insuficiente para escoar tanta água doce para o mar. Principalmente o Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS) concluiu que o melhor caminho para essas água era concentrá-la na lagoa Feia e lançá-las ao mar por um longo canal ligando a lagoa Feia ao mar. Houve uma tentativa feita antes de abertura de canal semelhante. Chamava-se canal de Jagoroaba, mas não funcionou. Entre 1942 e 1949, o DNOS abriu o famoso canal da Flecha, assinalado em marrom no mapa abaixo. Além de escoar água da lagoa Feia, ele recebia outros canais pela margem esquerda. O canal centraliza a sistema de drenagem pela margem direita do Paraíba do Sul. Já conversei com pescadores e moradores de Barra do Furado e do Farol que pensar ser o Flecha um rio feito pela natureza ou por Deus. Ele foi aberto pela mão humana.

No seu trecho final, o DNOS construiu um sistema de comportas para regular o nível da lagoa Feia. Ele pode ser visto com facilidade, pois tem também a função de pontes para veículos. Esse sistema é relativamente novo. Ele foi construído nos anos de 1970. Entre 1978 e 1981, os pescadores temeram que o Durinho da Valeta, na origem do Canal da Flecha fosse retirado e se fizeram alguns movimentos de protesto. Em Barra do Furado, os pescadores protestaram com o fechamento da ligação do canal de Flecha ao trecho do rio Iguaçu até Lagamar. Eles pescavam aí o camarão rosa em grande qualidade e qualidade. O DNOS fechou essa ligação para que caminhões transportassem as pesadas comportas para a ponte sobre o Flecha. Os pescadores de Barra do Furado a abriram com pás e enxadas. O DNOS a fechou novamente. O descontentamento dos pescadores com o DNOS foi muito grande entre 1978 e 1981. Os da lagoa Feia não queriam que o órgão removesse o Durinho da Valeta. Os pescadores da lagoa do Campelo queriam que as comportas do canal da Cataia ficassem abertas para o peixe chegar à lagoa. Os de Barra do Furado queriam que a ligação do canal da Flecha com o trecho do rio Iguaçu até o Lagamar ficasse aberto.


O clima ficou tão pesado que Maurício Rangel Reis, Ministro do Interior veio a Campos e se reuniu com os pescadores na IFF-Centro, que então se chamava CEFET. Lá, as reivindicações foram apresentadas. “Queremos que o Durinho da Valeta permaneça onde está”, reclamavam os pescadores da lagoa Feia. “Ele permanecerá lá”, garantia o Ministro. “Queremos que as comportas da Cataia fiquem abertas”, pleiteavam os pescadores da lagoa do Campelo. “Elas ficarão abertas”, prometia o Ministro. “Queremos que a ligação do canal da Flecha com o Iguaçu fique aberta”, reivindicavam os pescadores de Barra do Furado. O Ministro mandou abrir a ligação. O ponto sob a estrada foi aberto e recebeu o nome de Buraco do Ministro.


Quase todos esqueceram esta história. Os pescadores nem lembram mais que capturava-se ali muito camarão rosa. Como participei de tudo, deixo aqui registrado o motivo de o Buraco do Ministro ter esse nome, muito embora o DNOS o tenha tapado pouco depois de o Ministro Rangel Reis voltar para Brasília.      

O Buraco do Ministro está assinalado com um ponto preto em que a linha azul se encontra com a linha vermelha


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